domingo, 10 de agosto de 2008

Mais uma do Blog do Birner.

Posto abaixo mais um post do blog do Birner. Este é mais um do Xico Mata, que escreve no blog sobre a relação entre esporte e política.

Em Berlim, 1936.

A história é a mãe da verdade, êmula do tempo, depositária das ações, testemunha do passado, exemplo e anúncio do presente, advertência para o futuro. (Miguel de Cervantes em Dom Quixote).
Os que não conseguem relembrar o passado estão condenados a repeti-lo. (G. Santayana).
Em 1931, o Comitê Olímpico Internacional (“COI”) atribuiu à cidade de Berlin a organização dos Jogos Olímpicos de 1936.
Um ano depois, o Partido Nacional Socialista Alemão (NSDAP) obteve apenas um terço dos votos, e seu líder Adolf Hitler foi derrotado na eleição presidencial pelo velho marechal Paul Von Hindenburg.
Porém, em 30 de janeiro de 1933, Hitler foi nomeado Chanceler (cargo equivalente ao de um Primeiro Ministro) com a ajuda de industriais e homens de direita, reunidos por Franz von Papen e Alfred Hugenberg.
Esses personagens foram ingênuos ao imaginar que poderiam se servir de Hitler sem a ideologia nazista para solucionar a grave crise alemã. De fato, no início, o novo governo foi composto apenas por dois membros do partido nazista: Hermann Goring, encarregado da Prússia, e Wilhem Frick no comando do Ministério do Interior.
No entanto, longe de se deixar dominar pelos conservadores de direita, Hitler estabeleceu alguns meses depois o terrível Gleichschaltung (1933 a 1937), cujo objetivo foi à eliminação sistemática de toda organização e instituição não nazista, como por exemplo, os sindicatos e partidos políticos.
O desmantelamento da frágil República de Weimar com a chegada ao poder da ditadura nazista permitiu a proclamação do III Reich, no dia 15 de março de 1933, durante uma grandiosa cerimônia ocorrida em Potsdam, junto ao túmulo de Frederico II da Prússia.
Olimpíada: Instrumento de propaganda
A Olimpíada de Berlin foi um poderoso instrumento de propaganda a favor do regime. O intuito era aproveitar a ocasião para evidenciar o poder e a supremacia da raça ariana.
Contudo, se não fora possível por diversas vezes comprovar tal supremacia graças ao formidável afro-americano Jesse Owens - ganhou quatro medalhas de ouro no atletismo (100 m, 200 m, salto em distancia e revezamento 4 x 100 m) - a Alemanha nazista tentou demonstrar a capacidade de ordem e disciplina de seu povo.
Na véspera dos jogos, as autoridades nazistas, por intermédio da Gestapo, promoveram prisões em massa de opositores políticos, judeus e ciganos, cujo objetivo era deixar Berlin mais “segura e agradável” para os turistas. Ao mesmo tempo em que eram construídas as instalações olímpicas, o campo de concentração de Oranienburg contava com 1.000 prisioneiros.
Já durante a competição, o regime nazista tentou camuflar a sua virulenta política racista. Cartazes e outdoors que traziam mensagens anti-semitas foram temporariamente retirados das ruas. Os jornalistas esportivos alemães foram instruídos pelas autoridades para evitarem os comentários nacionalistas e racistas em suas reportagens.
Desse modo, o regime aproveitou a Olimpíada para deixar aos espectadores e jornalistas estrangeiros a falsa imagem de um governo pacífico e tolerante.
A Alemanha saiu vitoriosa da XI edição dos Jogos Olímpicos com o total de 89 medalhas. Sua hospitalidade e a organização do evento receberam eloqüentes elogios dos visitantes.
Após a Olimpíada, os esforços propagandísticos prosseguiram com o lançamento em 1938 do documentário: Os Deuses do estádio, dirigido por Leni Riefensthal, que fora encomendado pelo governo nazista para promover a superioridade da raça ariana e divulgar a gloria do regime.
Três anos depois, o anfitrião que se mostrou “hospitaleiro” e “pacifista” invadiu a Polônia e deu inicio ao mais sangrento conflito mundial, sem precedentes na história da humanidade.
O Barão aprovou!O idealizador das Olimpíadas da era moderna, o influente Pierre de Coubertin, já ausente da presidência do COI desde 1926, considerou os jogos olímpicos de Berlin o mais bem organizado de todos os tempos.
“O que? O espírito olímpico desfigurado pela propaganda? Isso é totalmente falso! O enorme sucesso dos Jogos de Berlin contribuiu surpreendentemente para a realização do ideal olímpico (…..) Temos que deixar brotar livremente o espírito olímpico, e não temer nem a paixão, nem o excesso que criam o fervor e o entusiasmo necessários (…) É importante que cada nação tenha a honra de acolher os Jogos e de celebrá-los a seu modo, segundo a sua imaginação e seus meios. Na França, todos estão preocupados que a Olimpíada de 1936 fora realizada pela força da disciplina nazista. Como poderia ter sido diferente? Ao contrario: é eminentemente desejável que os Jogos sejam assim, através dessa alegria, com a roupagem que cada povo confecciona durante quatro anos” declarou o barão durante uma entrevista ao jornal Frances Le Journal, em agosto de 1936.
Logo após a cerimônia de encerramento, o barão foi felicitar pessoalmente Adolf Hitler pelo sucesso da Olimpíada, dizendo ao Führer que ela serviria de exemplo para as futuras realizações. De fato, as teorias elitistas do barão corroboravam com os discursos nacionalistas e racistas do ditador nazista. As declarações do barão ilustram bem esse pensamento:
- “À raça branca é de essência superior, todas as outras devem se curvar” ou,
- “Existem duas raças distintas: Aquela de olhar sincero, músculos fortes, abordagem segura e aquela dos doentes, olhar resignado e humilde, ar derrotado. Bem! É como nos colégios do mundo inteiro: Os fracos são excluídos desse modo, o benefício desta educação é valioso apenas aos fortes” (em educação inglesa).
Além disso, Coubertin não era simpático à participação feminina na Olimpíada. Durante os Jogos de Stockholm, o barão deu a seguinte declaração:
“Uma Olimpíada feminina seria impraticável, desinteressante, sem estética e imperfeita. O verdadeiro herói olímpico é a meu ver, um macho adulto. Os Jogos Olímpicos tem que se restringir apenas aos homens, o papel das mulheres deve ser o de coroar os vencedores”.
A Tentativa de Boicote e a Olimpíada do PovoMovimentos para o boicote dos jogos olímpicos de Berlin foram criados nos Estados Unidos, Reino Unido, França, Suécia, Tchecoslováquia e Holanda.
Alguns adeptos do boicote idealizaram uma alternativa aos Jogos Olímpicos de Berlin: a Olimpíada do Povo, prevista para o verão de 1936, em Barcelona.
No entanto, tal projeto foi anulado por causa da sangrenta Guerra Civil espanhola. Milhares de competidores já tinham chegado à capital da Catalunha quando houve o cancelamento do evento.
Não foram poucos os atletas judeus que decidiram boicotar a olimpíada nazista. Nos Estados Unidos, organizações judaicas como o Congresso Americano judeu e o Comitê Judeu do trabalho pediram o boicote.
Entretanto, na mesma época, Avery Brundage, presidente do Comitê Olímpico Americano, afirmou em comunicado oficial que “alguns judeus deveriam compreender que eles não poderiam utilizar a Olimpíada (Berlin 1936) como instrumento de boicote contra os nazistas” (Fair Play for American athletes, publicado pela American Olympic Committee, 1935).
Depois do voto da União dos Atletas Amadores Americanos em favor da participação, em dezembro de 1935, outros países seguiram o exemplo e o movimento pelo boicote não vingou.
Publicado em 07 de agosto de 2008.

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