terça-feira, 10 de março de 2009

Histórias de lutas: mulheres negras no esporte

Wanda dos Santos embarca para os Jogos Olímpicos de Roma, 1960 de forma solitária. Na delegação brasileira há 81 atletas, sendo 80 homens e apenas ela como representante do sexo feminino. Quatro anos depois, na edição de Tóquio, outra mulher, Aida dos Santos, marca seu nome e consegue o 4º lugar no salto em altura.
Em um país como o nosso com seus milhares de Santos e Silvas anônimos e uma curta memória coletiva, que insiste em apagar pessoas que marcaram seu nome na Clio, é justo que na semana em que se segue à comemoração do dia Internacional da Mulher, somemos as homenagens feitas a tantas outras representantes do sexo feminino. Nossa forma de fazer isso é lembrar destas duas mulheres negras desbravadoras no esporte brasileiro e que até hoje, talvez por terem sentido na pele o racismo e o machismo, lutam por transformação social.
Wanda e Aida tiveram que enfrentar uma sociedade que impôs sobre as mulheres um jugo moralístico machista para subjugá-las, lhe dando uma papel: o do lar, da submissão ao homem.
Wanda dos Santos foi a segunda mulher negra a disputar uma Olimpíadas, a primeira foi Melania Luz nos 200 metros em Los Angeles/EUA, 1948. Wanda participou dos 80 metros com barreira nos Jogos de Helsinque/Finlândia, em 1952, e dos Jogos de Roma/Itália, em 1960. Além disso, a atleta teve vitoriosas participações em Jogos Pan-americanos, disputando as edições de Buenos Aires/1951, Cidade do México/1955, Chicago/1959 e São Paulo/1953, conquistando em todas essas edições quatro medalhas, 3 de bronze e 1 de prata.
Já Aida dos Santos foi, até o ouro de Maurrem Maggi em Pequim/2008, dona do melhor resultado do atletismo feminino em olimpíadas com seu 4º lugar no salto em altura. Para chegar a tal lugar, Aida enfrentou a falta de preparação da equipe brasileira, competindo com uma sapatilha emprestada, de uso em corridas, sem técnico, quem a auxiliou na competição foi um técnico da delegação cubana. A atleta disputou, ainda, mais uma edição dos Jogos, na cidade do México em 1968. Já em Pan-americanos disputou os Jogos de Winnipeg/Canadá, 1967 e Cali/Colômbia, 1971. Nas duas edições levou para casa a medalha de bronze no pentlato. Além disso, ela é mãe de outra vitoriosa atleta negra, Valeskinha.
Ambas lutaram e lutam para chegar aonde chegaram. Aida nasceu em Niterói, sua família chegou a passar fome e apanhar do pai alcoólico. Já Wanda lutou para enfrentar o preconceito da década de 40na capital paulista e atuar por clubes como Palmeiras e São Paulo.

Mas o que faz dessas mulheres heroínas é a sua dedicação ao esporte como mecanismo de cidadania e, conseqüentemente, de transformação social. Wanda é professora de Educação Física para crianças do ciclo I do Ensino Fundamental (até a 4ª série). E até hoje compete, ganhou no último Grand Prix Mercosul de Atletismo Master, ano passado em Porto Alegre, quatro medalhas de ouro.
Já Aida coordena um instituto que leva seu nome em Niterói, proporcionando à crianças e adolescentes de baixa renda, entre 7 e 16 anos, condições de inclusão social por meio do esporte, através de duas modalidades: atletismo e voleibol.
São de mulheres assim, praticamente anônimas para a grande maioria da população brasileira, que constroem a história do povo negro. Como representantes da raça tiveram que se superar para viverem, para competirem. E talvez por isso, até hoje se dedicam ao esporte como meio de inclusão social e de conquista da cidadania. Nesta trajetória, percebemos a coragem, a ousadia e a garra intrínsecas destas mulheres, histórias que foram escritas a partir da luta e da vontade de lutar contra uma sociedade que lhes reservava outros papéis.




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